Após mais de três décadas desde a descoberta da Aids, a incidência da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) tem aumentado entre adolescentes e adultos jovens. No Brasil, em 2014, foram notificados 4.663 casos novos de portadores de HIV na faixa de 15 a 24 anos. A principal forma da infecção por HIV foi por via sexual.
Pesquisa conduzida por Carina Caires Gazini Sobrino, no programa de pós-graduação em Saúde da Criança e do Adolescente, avaliou a evolução de desfechos psicossociais e qualidade de vida em jovens vivendo com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) no primeiro ano após o diagnóstico.
O estudo, longitudinal, foi orientado por Marcos Tadeu Nolasco da Silva e por Eloisa Helena RubelloValler Celeri, professores dos Departamentos de Pediatria e Psicologia Médica e Psiquiatria, respectivamente.
Os principais instrumentos da pesquisa foram escalas quantitativas, que fazem parte das Medidas de Desfechos Relatados pelo Paciente. Utilizados de forma crescente nas últimas décadas, os desfechos relatados pelos pacientes descrevem diretamente como estes se sentem ou funcionam em relação a uma condição de saúde ou seu tratamento, sem interpretação pelos profissionais ou cuidadores.
“No cenário da infecção por HIV em jovens, com seus multifacetados aspectos clínicos e psicossociais, a adoção de desfechos relatados pelos pacientes pode fornecer subsídios para a tomada de decisões ligadas ao cuidado. Tais desfechos podem ser avaliados tanto no contexto interno de doenças específicas como na comparação entre diferentes condições, incluindo populações saudáveis”, explica Carina.
Um dos principais desfechos avaliados foi a Qualidade de Vida (QV). Desde 1970, houve um crescente interesse pela avaliação da QV relacionada às deficiências ou condições crônicas de saúde. Há diferentes formas de defini-la, sendo um conceito complexo e abrangente, envolvendo várias dimensões: biológica, psicológica, social, cultural e ambiental.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) define qualidade de vida como “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais eles vivem e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”.
Para o estudo realizado na Unicamp, participaram 34 jovens com de 16 a 24 anos com diagnóstico recente de infecção pelo HIV atendidos em um serviço de referência em Campinas. O grupo foi comparado com 30 estudantes universitários saudáveis da mesma faixa etária.
As diferenças de características de qualidade de vida, satisfação com a vida, resiliência, suporte familiar, personalidade e saúde mental foram avaliadas no momento inicial do diagnóstico, seis e 12 meses após o início do tratamento.
Na avaliação longitudinal da qualidade de vida observaram-se diferenças estatisticamente significativas no momento inicial em todos os domínios, com escores inferiores para o grupo de jovens com HIV. Tais diferenças não foram observadas para os domínios: psicológico, percepção geral de saúde, social e qualidade de vida total após seis e 12 meses. Em relação ao domínio de percepção geral de qualidade de vida, não se observaram diferenças entre os grupos após 12 meses.
A pesquisa apontou que, na avaliação do suporte familiar, o grupo de jovens com HIV apresentou escores inferiores de percepção familiar para os domínios: afetivo-consistente, adaptação familiar e total, no momento inicial do estudo. Entretanto, tais diferenças em relação ao grupo de controle deixaram de ser observadas aos seis e 12 meses de acompanhamento.
“A melhora da percepção de suporte familiar durante o acompanhamento pode estar associada à melhora da percepção de qualidade de vida, bem-estar e indicadores de saúde mental apontados pelos jovens no decorrer da pesquisa”, pontua Carina.
Houve diferenças estatisticamente significativas na avaliação da personalidade no momento inicial, com escores inferiores para o grupo de jovens vivendo com HIV nos domínios amabilidade e extroversão e superiores no domínio neuroticismo, quando comparado do grupo controle.
“Aos 12 meses, não foram observadas essas diferenças entre os grupos”, revelou Carina.
Na avaliação longitudinal de transtornos psiquiátricos, observaram-se, no momento inicial, riscos significativamente mais elevados de episódio depressivo, suicídio, agorafobia e dependência ou abuso de álcool e substâncias no grupo de jovens com HIV em relação ao grupo controle. Com um ano de acompanhamento, os riscos de depressão e suicídio não eram superiores ao grupo de controle.
Os dados do estudo sugerem que, ao tomarem contato com o diagnóstico de infecção pelo HIV, uma doença crônica com alto estigma social, os jovens apresentaram inicialmente uma redução global em desfechos ligados ao bem-estar. A evolução longitudinal sugere um provável retorno aos níveis basais de tais indicadores, reforçando a importância do cuidado integral a esta população vulnerável.
Tese: Evolução de desfechos psicossociais em jovens vivendo com o vírus da imunodeficiência humana no primeiro ano após o diagnóstico: estudo longitudinal
Autora: Carina Caires Gazini Sobrino
Orientadores: Marcos Tadeu Nolasco da Silva e Eloisa Helena Rubello Valler Celeri
Programa: Saúde da Criança e do Adolescente
Texto: Edimilson Montalti
Assessoria de Relações Públicas e Imprensa da FCM, Unicamp