Ineditismo e argumentação favorecem escolha de artigos para revistas científicas

Em fevereiro de 1997, uma notícia estampava na capa da revista científica Nature: Dolly, a primeira ovelha clonada era mostrada para o mundo. O assunto poderia não ter vido à tona se o problema fosse o inglês macarrônico com que o autor escreveu o artigo e a insistência de uma jovem brasileira: Andrea Kauffmann-Zeh, editora sênior da revista. Ao ver o ineditismo da descoberta, Andrea imediatamente pediu ao pesquisador Ian Wilmut que reescrevesse o artigo e enviasse novamente à revista. Dolly virou celebridade em toda a imprensa mundial.

Este fato ilustra o trabalho e a experiência da jovem bióloga e geneticista brasileira que por seis anos leu e avaliou milhares de artigos na área das ciências biológicas para a revista Nature. Pelo seu crivo, 90% dos artigos eram descartados. Os motivos Andrea contou na manhã desta terça-feira (10) no Salão Nobre da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp para o primeira turma que participa da oficina sobre construção, publicação e revisão por pares de artigos científicos. A oficina faz parte da programação da 5ª Semana de Pesquisa da FCM.

Andrea disse que a chave de um artigo é uma pergunta bem formulada. A pergunta será o fio condutor da construção do artigo. Um bom artigo deve conter introdução, materiais e métodos, resultados e discussão, academicamente designados pela sigla IMRAD. “Até a década de 1980, um artigo continha mais de 50 folhas. Que editor consegue ler mais de 200 trabalhos por semana nos dias de hoje?”, apontou Andrea.

Mas Andrea vai mais longe e diz que, quanto maior o impacto da revista em que se quer publicar, menor é o gargalo por onde passam os artigos. E alguns pontos fecham essa peneira: olhar limitado do pesquisador para um problema, sentença suicida, marketing ruim da relevância da descoberta e, principalmente, falta de novidade. “A Nature e a Science estão interessadas em artigos que abram as portas para novas linhas de pesquisas ou que encerrem uma discussão sobre um assunto, ou seja, aquele artigo conclusivo naquela área do conhecimento”, explicou Andrea.

Uma das reclamações que Andrea sempre ouve nas palestras e cursos que ministras pela empresa Publicase da qual é sócia, é a rejeição de artigos por causa do idioma. Muitos pesquisadores ao submeterem seus artigos para publicação os recebem de volta pelo fato do inglês não ser dos melhores. Retomando o exemplo que deu no início de sua apresentação, Andrea é clara em dizer que o inglês é o menor dos problemas e que há uma supervalorização do língua não por parte dos editores, mas sim dos revisores.

“Para o inglês, podemos fazer uma revisão e corrigir os problemas. O mais difícil é o autor argumentar estrategicamente a relevância da sua descoberta. Artigo não é relatório, não é fragmento de tese e nem prêmio de consolação. Artigo científico é o registro de um processo”, explicou Andrea.

Amanhã, Andrea faz a segunda oficina com mais um grupo de 100 alunos, professores e pesquisadores que se inscreveram previamente para participar da 5ª Semana de Pesquisa da FCM.

Texto e foto: Edimilson Montalti