FCM perde Rachel Lewinsohn


Rachel Lewinsohn, médica de origem polonesa e especialista em medicina tropical vinculada ao Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, faleceu no dia 31 de agosto, em Campinas. Com 90 anos, sempre se dedicou à pesquisa em enzimologia e carcinogenese experimental. Durante anos, ministrou o curso de história da medicina, na FCM, quando era parte do currículo de graduação, na década de 1990. Outra área de interesse foi a Doença de Chagas.

Rachel teve uma trajetória de vida pouco comum para um docente universitário, conforme relata seu filho, o professor Thomas Lewinsohn, do Instituto de Biologia da Unicamp, em texto enviado para Assessoria de Imprensa da Unicamp e transcrito na íntegra logo abaixo.

Nascida na Polônia, quando tinha dois anos sua família emigrou para a Alemanha para fugir dos pogroms, ataques antissemitas. Em 1933, quando os nazistas assumiram o governo na Alemanha, a família novamente teve de fugir, desta vez para a Bélgica, e um ano depois vieram para o Brasil.  Imigrantes sem recursos, Rachel teve de abandonar a escola e buscar emprego, como secretária, aos 13 anos, no Rio de Janeiro.

Decidiu voltar a estudar com os dois filhos já adolescentes.  Em 1966, aos 45 anos, prestou os exames para obter os diplomas de ensino fundamental e médio e, ao mesmo tempo, preparou-se para o vestibular. Naquele ano, obteve o 5o. lugar no vestibular para Medicina da Universidade Federal Fluminense, curso que concluiu em 1971.  Sua longa experiência como secretária executiva permitiu que taquigrafasse e transcrevesse todas as aulas do curso.

Após trabalhar por um breve período na Santa Casa do Rio de Janeiro, envolveu-se com pesquisa de doenças tropicais, que a levaram a um Mestrado na London School of Hygiene and Tropical Medicine, com um estudo experimental sobre anemia causa por infecção dupla por Schistosoma e Plasmodium. Retornando ao Brasil em 1973, seus interesses se concentraram em alterações enzimáticas associadas a queimaduras graves. Esta pesquisa levou-a novamente à Inglaterra, onde obteve em 1980 o Doutorado na Universidade de Londres, com a tese intitulada Benzylamine Oxidase - An Enzyme in Search of a Function". Foi convidada para um pós-doutorado, por dois anos, na Universidade de Cambridge, como bolsista Wellcome. Em Cambridge, foi vizinha e amiga da família do físico Steven Hawking.

Paralelamente à pesquisa em Enzimologia, Rachel Lewinsohn tinha forte interesse em História da Medicina.  Em 1979 obteve um segundo Mestrado, na "Worshipful Society of Apothecaries of London",  com um estudo sobre a Descoberta do Trypanosoma cruzi por Carlos Chagas.  Na FCM, criou uma disciplina pioneira de "História da Medicina", que foi ministrada para alunos de graduação e pós-graduação de 1990 a 2000.  Seu livro sobre a história de epidemias, "Três epidemias - Lições do passado", foi publicado pela Editora da Unicamp em 2003.  A enfermidade não permitiu que concluísse sua última orientação, a tese de Doutorado de Cristina Gurgel sobre “Índios, Jesuítas e Bandeirantes. Medicinas e doenças no Brasil dos séculos XVI e XVII”, defendida em 2009 na FCM sob orientação de Eros de Almeida.

Outros laços uniam Rachel à Unicamp.  Seu filho Thomas é professor titular de Ecologia do Instituto de Biologia.  Sua irmã, Fayga Ostrower, famosa artista plástica, teve seu "Caderno de Desenho", esboços para gravuras, publicado pela Editora da Unicamp em 2011. A biblioteca e correspondência com historiadores alemães de seu cunhado, Heinz Ostrower, foi incorporada ao Arquivo Edgard Leuenroth.

Rachel deixa um filho, cinco netas e dois bisnetos.

 

Texto: Edimilson Montalti - ARP-FCM/Unicamp

Fotos: ASCOM- Unicamp