"Entende-se por medicalização o processo por meio do qual as questões da vida social - complexas, multifatoriais e marcadas pela cultura e pelo tempo histórico - são reduzidas a um tipo de racionalidade que vincula artificialmente a dificuldade de adaptação às normas sociais a determinismos orgânicos que se expressariam no adoecimento do indivíduo."
(Ito & col., 2013)
A prática medicalizante decorre do processo, já citado anteriormente, de transformação das dores e questões da vida humana em temas do domínio médico e biológico. Essa tendência foi abordada e criticada inicialmente por Ivan Illich na passagem da década de 70 para a de 80, depois, muitos outros dircursos de personalidades como Michel Foucault, Peter Conrad, Peter Breggin e Thomas Szasz deram continuidade aos ideais contrários ao fenômeno da medicalização.
No caso do TDAH, não se fala, como já foi dito, em más condições escolares, em ambiente familiar caótico ou em excesso de estímulos violentos, fala-se, em genes determinantes de uma doença neurológica que impede a criança de prestar atenção e se comportar, tendo que, para tanto, ser medicada.
Para exemplificar, a Associação Brasileira do Déficit de Atenção, em seu site, escreve que as causas do TDAH são, baseada em estudos: hereditariedade, substâncias ingeridas na gravidez, sofrimento fetal, exposição a chumbo, problemas familiares (Nossa! Estavamos errados! Mas espera, logo embaixo está escrito: "Estudos recentes têm refutado esta idéia. As dificuldades familiares podem ser mais conseqüência do que causa do TDAH (na criança e mesmo nos pais).Problemas familiares podem agravar um quadro de TDAH, mas não causá-lo.") e outros como, corante amarelo, aspartame, luz artificial, deficiência hormonal, deficiências vitamínicas na dieta.
Todas essas causas são embasadas por muitos estudos, mas TODOS os estudos devem ser analisados criticamente, quem faz esse estudo? ele é patrocinado por alguma empresa farmaceutica? quais são os métodos empregados? MOYSES & COLLARES (2010) analisaram muitos estudos que defendem essa teoria biologizante do TDAH e muitos deles apresentam muitas falhas, alguns serão citados aqui.
Quanto aos resultados obtidos, cada grupo de pesquisadores encontra uma área do cérebro que é afetada na doença, não existem dois estudos que têm o mesmo resultado. Na pesquisa dos genes determinates dessa doença, foram encontrados 4 alterações cromossômicas diferentes e 4 genes que são os chamados genes candidatos a predisposição da doença. Também não há consenso.
Outros problemas desses estudos são: não se explica como foram feito os diagnósticos de TDAH, qualquer criança agitada foi incluída?; não se sabe como os participantes dos estudo são escolhidos, sem critérios de inclusão e exclusão bem definidos; não há menção de ter sido comparada com um grupo de crianças "normais", como saber se as crianças "normais" também tem essas alterações?; o número da amostra quase sempre é pequeno, ou seja, poucas crianças são estudadas e existem 8 hipóteses genéticas para a doença, é bem provável que alguma criança, normal ou não, apresente-as.
GALABURDA é um dos autores mais prestigiados desse assunto, MOYSES & COLLARES (2010) analisaram um dos seus estudos mais importantes de 1985 em que defende a existência de defeitos na anatomia do sistema nervoso central que são responsáveis por essas entidades. Este relato é criticado pela falta de critérios, baixa amostragem (5 pessoas) e a falta de comparação com pessoas “normais". Estudos indicavam que os cérebros de disléxicos eram assimétricos, portanto a causa da dislexia era anatômica, entretanto, esse mesmo autor fez um estudos com 100 cérebros pós-morte de pessoas “normais”, resultando que apenas 16% deles eram simétricos.
Atualmente, os estudos para embasar o TDAH são feitos com neuroimagem, a funcionalidade cerebral da criança é analisada enquanto ela faz uma atividade que exija atenção. Entretanto, ao colocar uma criança anatomica e biologicamente perfeita, mas com vários problemas pessoais, escolares, sociais para ler um texto, obviamente ela não vai conseguir e o exame atestará pouca função na área cerebral da atenção, mas a causa disso não é apontada pelo exame. Ou seja, o exame não vai mostrar se o resultado deu-se porque a criança tem "defeitos no cérebro" ou se é porque ela cresceu em um ambiente que não permitiu um desenvolvimento adequado.
Logo, as autoras frizam que antes de fazer estudos que procurem causas genéticas e orgânicas para o TDAH, primeiro, é preciso provar que essa doença existe ou se ela se trata apenas da personalidade da criança, como fazer o diagnóstico e como excluir desse grupo de diagnosticados aqueles que, como já foi explicado na página TDAH e outros conceitos, tem problemas familiares, tem que trabalhar aos 10 anos, vive no computador e na TV e por isso tem déficit de atenção e hiperatividade. As autoras acreditam que essa doença talvez exista, mas o seu diagnóstico, como está sendo feito hoje, traz para inúmeras crianças normais o ônus de um diagnóstico, de ser doente e de ter que se medicar.
No item TDAH Metilfenidato falaremos um pouco da influência das empresas farmacêuticas nesses diagnósticos exagerados.