Estamos diante do maior desafio desta geração de profissionais da saúde, a pandemia por Covid-19. É fato que somente estaremos livres do Covid-19 quando a quase totalidade da população adquirir a capacidade de produzir anticorpos contra este vírus, o que pode ocorrer pela infecção ou então pela vacinação. Enquanto isso não ocorrer, resta-nos tomar todas as precauções possíveis para retardar o contato. Um ponto que emerge é que o isolamento social protege as pessoas e o sistema de saúde, espaçando a ocorrência de casos e evitando o caos que ocorre na Itália.
Para tentar dimensionar este desafio, a província de Hubei, onde tudo começou, teve cerca de 68 mil casos confirmados e, possivelmente, dois milhões de pessoas (dado superestimado) tiveram infecção assintomática ou com sintomas leves. Porém, a população de Hubei é de 58,5 milhões de habitantes, ou seja, mais de 56 milhões continuam vulneráveis à infecção por Covid-19.
As temperaturas de verão e outono no Brasil possivelmente oferecem alguma proteção. Será que este fator poderia evitar a ocorrência do pico de doentes da Itália? Não me parece absurdo admitir um “sim” para esta resposta.
Em três meses iniciaremos o inverno. Assim, será que temperaturas mais baixas favoreceriam a transmissão? Se a resposta for sim, será que esta variação climática prolongaria o tempo de duração da pandemia no Brasil, até o fim do inverno? Também não me parece absurdo admitir um “sim” para esta resposta.
Ganharemos esta luta como a humanidade ganhou todas as lutas contra pandemias ou epidemias que antecederam.
O custo será alto pelas vidas perdidas, pelo impacto negativo na economia, entre inúmeros outros fatos. As grandes potências estão superpreparadas para se defender de um ataque nuclear, mas estão muito vulneráveis a um ataque viral que é capaz de causar milhares de mortes. Nos Estados Unidos o total de mortes atribuídas ao Covid-19 já é muito maior do que o total de 2.977 vítimas do ataque às torres gêmeas.
No Brasil, neste ambiente de disputa política entre governantes, felizmente emerge um universo de profissionais de saúde altamente comprometido, que coloca a própria vida em risco, que sofre discriminação, que assume uma sobrecarga de trabalho para cumprir com seu juramento.
Na Unicamp, desde o início deste ano há profissionais e dirigentes que vêm discutindo e planejando ações para quando a epidemia chegar. A este time foi se agregando profissionais, de tal forma que temos um exército para atuar e que busca garantir reservas para os momentos mais difíceis.
É fantástica a nossa capacidade de mobilização.
O contraditório é que, para nós e para o mundo, este é um momento único, uma experiência única, pois há um ganho imenso de conhecimento e competências em curtíssimo espaço. É um momento de grande solidariedade. Nós podemos ou precisamos nos isolar para atenuar a pandemia, mas o mundo precisará se unir, globalizar para melhor enfrentar futuros ataques virais. As diferenças econômicas e sociais nos fragilizam enquanto combatentes com prejuízos para os mais pobres e para os mais ricos.
Luiz Carlos Zeferino é médico ginecologista e diretor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp
Foto de capa: Freepix