XIV Semana de Pesquisa - 2023


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DESIGUALDADES ENTRE NEGROS E BRANCOS NOS SERVIÇOS DE SAÚDE BUCAL SEGUNDO SEXO: ESTUDO DE BASE POPULACIONAL EM CAMPINAS, SP

Autores: LIVIA HELENA TERRA e SOUZA, Marilisa Berti de Azevedo Barros, Margareth Guimarães Lima


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RESUMO

INTRODUÇÃO: A desvantagem econômica e social da população negra, a prevenção de doenças e a assistência à saúde dificultada, com vulnerabilidade aos processos discriminatórios são fatores que podem ampliar a iniquidade em saúde, desprivilegiando essa população (1). O racismo estrutural é uma decorrência da própria composição social, um conjunto de práticas sociais, institucionais, históricas, jurídicas e culturais dentro de uma sociedade que frequentemente privilegia algum grupo racial em detrimento de outro, que pode alimentar e manter as iniquidades raciais em saúde. A mulher também se apresenta em desvantagem nas condições de renda e posição social além de acumular uma sobrecarga de tarefas que afetam seu estado físico e emocional (2). A dor dental e a perda dentária, bem como outros agravos em saúde bucal em adultos, têm sido associados a fatores como educação, renda e grupo racial. A condição bucal, portanto, pode expressar uma história vivida e consequência de condições sociais, econômicas e políticas (3). Por isso, as iniquidades em saúde bucal são consideradas como um dos temas de pesquisa prioritários pela Organização Mundial da Saúde (4). É preciso identificar possíveis desigualdades no acesso, no atendimento e acompanhamento em saúde bucal que tendem a desprivilegiar os grupos socialmente vulneráveis e, nesse caso, a população negra. Os estudos sobre as desigualdades raciais em saúde que analisaram separadamente, homens e mulheres, são importantes considerando as especificidades da saúde segundo sexo, mas são poucos no Brasil.

OBJETIVOS: Avaliar a associação entre a raça/cor da pele na utilização dos serviços odontológicos por sexo e as possíveis interações entre a raça e o sexo.

MÉTODOS: Trata-se de um estudo epidemiológico, do tipo transversal, realizado com dados do “Inquérito de Saúde de Campinas” (ISACamp), conduzido em 2014/15. Os indivíduos foram selecionados por meio de amostragem probabilística, estratificada e por conglomerados. As informações do inquérito foram obtidas por meio de questionário estruturado, aplicado com uso de tablets por entrevistadores treinados. As variáveis de desfecho foram: - Tipo de serviço odontológico usado (público, privado, convênio ou outro) e – Frequência de consultas odontológicas, com indicador de tempo da última consulta ao dentista (< 6 meses, entre 6 meses e <1 ano, entre 1 ano e <2 anos, 2 anos ou mais/nunca consultou). A variável de exposição foi a raça, avaliada pela cor da pele autorreferida [branca e negra (constituída pela população de pretos e pardos)] segundo classificação adotada pelo IBGE. Foram estimadas as prevalências dos indicadores de serviço de saúde odontológico segundo raça/cor da pele e testadas as diferenças por meio de teste de X2, em análises estratificadas por sexo. Foram estimadas as razões de prevalências (RP) com variância robusta ajustadas por renda mensal familiar per capita e idade. Também foi gerado um termo de interação multiplicativa com as variáveis raça e sexo. A interação foi calculada multiplicando-se uma variável pela outra (raça X sexo). Foram consideradas significativas as associações com valor de p<0,05.

RESULTADOS: Foram entrevistadas 1.953 pessoas com 20 anos ou mais, que representam a população de Campinas. Dessas, 68,6% se autodeclararam como brancos e 31,3% como negros. Participaram 347(30,0%) mulheres que se declaram negras e 773 brancas (69,0%) e entre os homens 265 (31,8%) se autodeclararam negros e 568 (68,1%) brancos. A prevalência da utilização de última consulta há 2 anos ou mais ou que nunca visitou o dentista foi 80% (IC95%:1,47-2,22) maior nas mulheres negras em relação às brancas. Não houve diferença significativa entre os homens. O termo de interação apresentou RP=1,42(IC=1,05-1,94). Avaliando a última consulta realizada em serviço público observou-se que a prevalência de utilização do SUS foi 69% (IC95%:1,19-2,41) maior nos homens negros em relação aos brancos, e foi mais do que o dobro nas mulheres negras em relação às brancas (RP=2,65-IC95%:1,86-3,78). O termo de interação apresentou RP=1,63(IC:1,05-2,53). Os resultados da interação mostraram que os fatores unidos de ser mulher negra aumenta a RP de menor frequência de consulta odontológica e maior uso de serviço público, respectivamente, em 42% e 63% em relação à simples multiplicação das RP de sexo e raça, separadamente.

CONCLUSÃO: As mulheres negras tendem apresentar menor frequência de consultas odontológicas em relação às mulheres brancas. Essa questão de saúde bucal está intimamente relacionada à capacidade de prevenção de problemas como cárie, periodontite e outros problemas futuros. Vale considerar que os resultados foram ajustados por renda mensal familiar per capita e mesmo assim as diferenças permaneceram significativas, mostrando que além do fator econômico, a disparidade de raça e sexo encontrada carrega outros fatores como preconceito e discriminação. Os resultados também apresentam que a mulher negra é a maior usuária do Sistema Único de Saúde (SUS) para tratamento da saúde bucal, o que alerta para a necessidade de estratégias especiais do serviço para atender essa população, no sentido de contribuir para minimizar o impacto do racismo na saúde e atender os princípios da equidade e do direito universal à saúde.


BIBLIOGRAFIA: 1. Brasil, Ministério da Saúde. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra: uma política do SUS. Brasília: Ministério da Saúde; 2010. 2. Braga, N. L., Araújo, N. M. de, & Maciel, R. H. (2019). Condições do trabalho da mulher: Uma revisão integrativa da literatura brasileira. Psicologia: Teoria e Prática, 21(2), 211-92. 3. Sandra Katsue Guiotoku; Simone Tetu Moysés; Samuel Jorge Moysés; Beatriz Helena Sottile França; Júlio Cezar Bisinelli Iniquidades raciais em saúde bucal no Brasil 2012. 4. Moreira TP, Nations MK, Alves MCFC. Dentes da desigualdade: marcas bucais da experiência vivida na pobreza pela comunidade de Dendê, Fortaleza, Ceará, Brasil. Cad Saude Publica. 2007;23(6):138392.



PALAVRA-CHAVE: Serviços de Saúde Bucal; Assistência Odontológica; Raça, Sexo



ÁREA: Saúde Coletiva

NÍVEL: Doutorado

FINANCIAMENTO: FAPESP



Faculdade de Ciências Médicas
Universidade Estadual de Campinas
Correspondência:
Rua Tessália Vieira de Camargo, 126. Cidade Universitária Zeferino Vaz. CEP 13083-887 – Campinas, SP, Brasil
Acesso:
R. Albert Sabin, s/ nº. Cidade Universitária "Zeferino Vaz" CEP: 13083-894. Campinas, SP, Brasil.

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