Especialista da Unicamp alerta sobre controvérsias no diagnóstico e tratamento da Síndrome de Irlen
Publicado por: Camila Delmondes
27 de julho de 2017

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Doença pode causar dificuldade de leitura e aprendizado

A Síndrome de Irlen é uma doença rara que causa dificuldade de leitura e aprendizado devido à sensibilidade extrema a certas ondas de luz. Pouco conhecida no Brasil, a correção pode ser feita por meio do uso de lentes coloridas, segundo o Instituto Irlen, da Califórnia. Estas lentes servem como “filtros” que facilitam a leitura.

Entretanto, de acordo com Maria Augusta Montenegro, neuropediatra do Departamento de Neurologia da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, os sintomas são vagos e muitas vezes similares à dislexia, ao transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) ou mesmo enxaqueca. Além disso, os custos para a aquisição e manutenção desses óculos especiais são extremamente caros.

“Dificuldade escolar gera alto grau de ansiedade nos pais e a família fará praticamente qualquer coisa para que um filho melhore o desempenho escolar. Não há comprovação cientifica sobre a eficácia das lentes coloridas no tratamento da Síndrome de Irlen”, alerta a especialista da FCM da Unicamp.

Maria Augusta concedeu entrevista para esclarecer pais, educadores e médicos sobre as controvérsias da Síndrome de Irlen.


FCM: O que é a Síndrome de Irlen?
Maria Augusta: Síndrome de Irlen tem sido divulgada pelo Instituto Irlen da Califórnia como sendo uma síndrome que causa dificuldade de leitura e interpretação de texto que pode ser corrigida por meio do uso de lentes coloridas. Estas lentes servem como “filtros” que facilitam a leitura.

FCM: Quais são os sintomas?
Maria Augusta: Os sintomas são heterogêneos e vagos, como por exemplo pular palavras quando lê, se distrair facilmente quando está lendo, necessidade de ler mais de uma vez uma linha, ficar cansado quando lê, olhos lacrimejarem durante a leitura ou sentir a necessidade de piscar quando está lendo, etc.

FCM: Síndrome de Irlen é considerada uma doença?
Maria Augusta: Existe uma classificação das doenças chamada CID (Código Internacional das Doenças) onde constam todas as doenças reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Essa classificação é muito dinâmica; pois, novas doenças surgem e outras desaparecem. Entretanto, apesar de ter sido descrita desde há várias décadas, a Síndrome de Irlen ainda não é considerada uma doença segundo esta classificação.

FCM: Como é feito o diagnóstico da Síndrome de Irlen?
Maria Augusta: Apenas o grupo de profissionais que descreveram a síndrome é capaz de fazer o diagnóstico. Eles têm uma série de pessoas treinadas que podem fazer a triagem dos casos com base nas especificações orientadas por eles.  No site do Instituto Irlen há um teste que pode ser feito online. Entretanto, o teste é pouco específico e pode ter alto grau de falso positivo. Eu mesma fiz o teste e fui diagnóstica com a Síndrome de Irlen sem nunca ter tido dificuldade de leitura e aprendizagem escolar.

FCM: Como é feito o tratamento?
Maria Augusta: O tratamento proposto é por meio do uso de óculos com lentes corretivas coloridas. Mas não há evidência cientifica suficiente que comprove a eficácia do tratamento.

FCM: Há algum efeito colateral associado ao tratamento?
Maria Augusta: Sim! Além de muitos pacientes abandonarem tratamentos comprovadamente eficazes, há um alto custo do tratamento.  Dificuldade escolar gera alto grau de ansiedade nos pais e a família fará praticamente qualquer coisa para que um filho melhore o desempenho escolar. Inclusive comprarão um par de óculos caríssimos com o custo estimado em vários milhares de reais.  Prescrever um tratamento ainda não reconhecido em nosso país, onde a maioria da população é economicamente carente, pode trazer grande prejuízo.

FCM: Recentemente, crianças têm sido diagnosticadas com essa síndrome e a utilização de óculos especiais tem sido adotada em detrimento ao tratamento preconizado por médicos. Isso é correto? Quais as consequências para a criança?
Maria Augusta: Não há comprovação cientifica sobre a eficácia das lentes coloridas no tratamento da Síndrome de Irlen. Inclusive, ainda há controvérsia sobre a existência desta síndrome.  Em hipótese alguma a criança deve abandonar o tratamento convencional para dificuldade em linguagem, leitura ou dislexia (fonoterapia) e substituí-lo pelo uso dos óculos com lentes coloridas.

FCM: Qual especialista deve ser procurado na suspeita de Síndrome de Irlen?
Maria Augusta: A criança com dificuldade em linguagem ou leitura deve ser avaliada por uma equipe especializada em dificuldade escolar que inclui avaliação com neuropediatra, fonoaudióloga e neuropsicóloga.  

 


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