A educação médica teve mudanças nas últimas décadas na forma de abordar e avaliar o processo ensino-aprendizagem. Se antigamente o termo usado era adquirir conhecimentos, hoje é desenvolver competências – aspectos cognitivos, habilidades técnicas, raciocínio clínico, atitudes, valores, comunicação e postura ética.

Por meio de atendimento ambulatorial supervisionado em Unidades Básicas de Saúde (UBS) de Campinas, os estudantes do quarto ano do curso de medicina da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp atendem crianças, adolescentes e adultos. A ação faz parte da disciplina Atenção Integral à Saúde, coordenada pela professora e pediatra Maria Angela Reis de Góes Monteiro Antonio.

“A disciplina avalia durante 33 semanas a aprendizagem dos estudantes por meio de prova teórica, nota de conceito, avaliação estruturada e um portfólio. Mais de 100 professores e preceptores médicos são envolvidos nas atividades”, revela Angela.

Ao final da disciplina, cada um dos 113 alunos do quarto ano de medicina produz um portfólio – documento elaborado pelo estudante que descreve todos os passos percorridos durante as atividades práticas de atendimento de clínica médica, ginecologia/obstetrícia e pediatria. O portfólio chega a ter, em média, 100 páginas.

Até o ano passado, a correção era feita à mão no auditório da coordenadoria do curso de graduação em Medicina por 70 professores e preceptores e levava em torno de 20 dias para ser concluída. Silvia Passeri, coordenadora pedagógica do curso de Medicina, em conjunto com a professora Angela, buscaram alternativas para modernizar e agilizar a correção do portfólio.

Com o apoio do Grupo Gestor de Tecnologia da Educação (GGTE) da Unicamp,  da desenvolvedora do Núcleo de Tecnologia da Informação (NTI) da FCM, Fabiana Silveira e da secretária da disciplina Gislaine Goulart dos Santos, Angela e Silvia inseriram o portfólio da disciplina Atenção Integral à Saúde na plataforma Moodle – ambiente virtual para cursos pela internet. Os alunos passaram a inserir seus relatos de atendimento online e responder questões estimuladas pelos professores para desenvolver o raciocínio lógico. E os professores e preceptores puderam fazer as correções pela internet.

“Para avaliar o que a aluno vivencia nas UBS, o portfólio é o instrumento adequado. Entretanto, muitos cursos não utilizam este instrumento de avaliação por conta da correção que é muito trabalhosa. Nosso objetivo foi criar mecanismo que facilite tanto o preenchimento quanto a correção, além da redução de custos no que se refere a impressão do documento. Agora o portfólio on-line pode ser corrigido pelo professor no local e horário mais conveniente para ele, e o mesmo portfólio pode ser corrigido simultaneamente por mais de um professor, como é o caso desta disciplina que requer a correção de professores de Clínica Médica, GO, Pediatria e Ética”, revelou Silvia.

Após a implantação do portfólio online, Silvia e Angela fizeram uma pesquisa de opinião com os 113 alunos e 70 avaliadores. De acordo com os dados, 85% dos alunos aprovaram o portfólio online e 95% dos avaliadores também aprovaram a nova forma online de avaliação.

O professor Rodolfo Pacagnella do Departamento de Tocoginecologia gostou bastante da mudança. Segundo Rodolfo, passar o portfólio para a plataforma online é o primeiro passo para a integração de várias outras informações de avaliação do aluno. “A versão online favoreceu a correção do portfólio em horários alternativos. A interface precisa ser mais amigável”, comentou.

A quartanista do curso de Medicina da FCM Maria Tereza Ferreira Cortez disse que portfólio é não apenas um instrumento de avaliação, mas também uma forma de revisar os casos atendidos de forma crítica e exercitar o raciocínio clínico.  Ainda segundo Maria Tereza, como a plataforma já vinha sendo utilizada durante a disciplina, foi bastante fácil incluir as informações no Moodle.

“O formato digital, implementado este ano, trouxe uma série de vantagens, tais como a padronização do modelo a ser entregue e a maior agilidade na correção. Uma dificuldade, no entanto, foi adicionar outros materiais, como genogramas, que só podiam ser anexados ao final. Permitir que os anexos ficassem após cada uma das questões, seria uma alteração simples, mas que permitiria um melhor resultado final”, comentou Maria Tereza.

 “O Moodle tem limitações que precisamos superar ou aprender a usar. Entretanto, permite a reflexão do aluno, melhora a integração entre os avaliadores e eu, como coordenadora de grupo tão grande, posso fazer gestão mais rápida. Para o perfil dessa disciplina, é o ideal”, comenta Angela.

Outro ponto destacado pela coordenadora pedagógica do curso de Medicina é que o portfólio permite uma reflexão do aluno sobre o seu próprio processo de aprendizagem, “O aluno ao relatar o atendimento médico realizado, ele faz uma reflexão crítica sobre a anamnese e o exame físico desde quando ele iniciou o atendimento ao paciente até ao raciocínio que o levou aquela conclusão sobre o diagnóstico e tratamento , ressaltando o que poderia ter sido melhor abordado, além da autocrítica e da busca de evidências na literatura, que enriquece ainda mais o processo”.

“O portfólio on-line disponibiliza o feedback ao aluno com os comentários dos avaliadores para serem discutidos junto às equipes da UBS em que o aluno está inserido, o acesso on-line facilita a comunicação mesmo em ambiente fora do campus universitário”, disse Silvia.

Ao implantarem esse projeto de avaliação online, tanto Silvia quanto Angela esperam motivar outras disciplinas a seguirem o mesmo caminho. “Arriscamos num novo método que não tem custo adicional para a Universidade e nada de sofisticado. É preciso que alguém puxe a fila”, comentou Angela. “Não basta estimular o uso de novos instrumentos de avaliação, é preciso oferecer apoio ao professor na utilização destes recursos para que haja maior envolvimento e motivação”, completou Silvia.