CIATox de Campinas completa 40 anos sendo referência nacional em toxicologia e especialidades afins
Publicado por: Karen Menegheti de Moraes
05 de dezembro de 2022

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Foi celebrada em 29 de novembro a cerimônia de 40 anos do Centro de Informação e Assistência Toxicológica (CIATox de Campinas). Inserido na Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp, o CIATox é, ao mesmo tempo, um serviço de apoio do Hospital de Clínicas (HC), além de oferecer, entre outros: assistência, ensino, pesquisa e extensão, na área de toxicologia e especialidades afins; capacitação de profissionais de saúde; realização de exames de laboratório pertinentes aos seus campos de atividades; assistência toxicológica à comunidade em consonância com os programas estabelecidos pelas unidades da Universidade; e levantamento de dados epidemiológicos.

 

Atendimentos, ensino e pesquisa

O professor Fábio Bucaretchi, coordenador associado do CIATox, apresentou dados de atendimento da unidade, que é referência em Toxicologia e Toxinologia Clínica na Região Administrativa de Campinas - que compreende 90 municípios, com uma população de sete milhões de habitantes. O Centro atende SAMU, UPAs, UTIs, UBSs e à população geral, em toda área de vigilância epidemiológica e sanitária e toxicovigilância. Um exemplo recente é o uso de fentanil vendido como LSD, uma droga de abuso. O total de atendimentos de casos de exposições tóxicas, de 1984 a 2021, foi de 157.166. 

Com relação ao ensino, desde 1983 são concedidas anualmente bolsas a estagiários. Dividindo por cursos de graduação, foram contempladas, ao longo da história de cada faculdade: FCM (622 alunos); Faculdade de Enfermagem (462 alunos); e Faculdade de Ciências Farmacêuticas (12 alunos); totalizando 1.096. Com relação à produção científica, foram publicados em periódicos de circulação internacional 112 trabalhos completos; e 13 de circulação nacional; além de  9 capítulos de livros ou manuais técnicos internacionais e 48 nacionais. “É um centro da universidade que também tem a obrigação de produzir investimento. Seguramente é o centro que tem mais publicações no Brasil”, declarou Fábio.

Histórico

Fábio resgatou também alguns momentos da história do CIATox. Na década de 1970, foram criados no Brasil os primeiros centros de informação e assistência toxicológica. Em 29 de novembro de 1982, depois de uma década de luta, por meio da Portaria GR 163/82, foi criado o Centro de Controle de Intoxicações (CCI) da Unicamp, vinculado à Reitoria. No ano seguinte, o CCI foi implantado em duas salas nas dependências da Santa Casa de Campinas, e recebeu a doação de uma linha telefônica, - na época, de valor elevadíssimo - pela Secretaria Municipal de Saúde de Campinas. Em 1996, o CCI passa a ser vinculado à FCM, atuando como serviço de apoio ao HC.

Mesa de honra composta por Fábio Bucaretchi, Erich de Paula, Lair Zambon, José Luiz Costa e Ronan José Vieira. Foto: Mercedes Santos/ARPI

Bicudo e a criação do CCI

O professor Ronan José Vieira, um dos fundadores do CCI, contou que, em fevereiro de 1983, foi descoberto na região de Campinas o bicudo - besouro pequeno que destrói o algodoeiro. “Com uma reação muito rápida, o pessoal ligado à Agricultura, devido ao possível prejuízo financeiro, resolveu pulverizar todas as plantações de algodão da região, e contrataram uma firma particular, sem estudar bem a coisa. Foi feita uma grande discussão com o pessoal da Agronomia, Biologia e Saúde, sobre a eficiência disso, e foi concluído que a ação tomada não ia acabar com o bicudo, uma vez que as plantações e animais aqui não estão isolados. Ia ser uma incontrolada intempestiva. O que tinha de fazer era conviver com o bicudo. Com essa celeuma, suspenderam a pulverização. Então quem abriu o CCI foi o bicudo. Pois é: um bichinho pequeno ajudou a gente a receber ajuda de toda ordem”, declarou.

Voltado à Universidade

“O CIATox é uma instituição que nos traz orgulho”, declarou Erich de Paula, diretor associado da FCM. “Atinge exatamente nossos objetivos: participa do ensino, faz extensão, gera conhecimento. É muito importante pois nos dá energia tanto para continuar investindo nessa estrutura, quanto poder perceber que boas ideias, quando tem por trás pessoas iluminadas como o professor Ronan, podem transformar. Parabenizo e manifesto apoio incondicional da FCM, quem tem uma visão muito clara da importância do CIATox em todas áreas colocadas; além de orgulho do professor Ronan, paraninfo da minha turma”, completou o diretor.

Para José Luiz Costa, coordenador executivo do CIATox, “nos próximos 40 anos o CIATox volta a ser muito centrado em nossa universidade, se estruturando nos alicerces do ensino, pesquisa e extensão. As parcerias com o município de Campinas, HC e apoio incondicional da FCM são fundamentais para gente. Somos um centro de uma universidade pública, com muito orgulho, cuja toda parte assistencial é SUS. Os números de publicações falam por si. Temos gerado pesquisas que crescem anualmente, com qualidade internacional reconhecida. O CIATox tem seguramente o melhor laboratório de análises para toxicologia clínica do Brasil, com capacidade ímpar de fazer diagnóstico de intoxicações. Isso vem de parcerias e apoios, como o do Ministério Público do Trabalho de Campinas. Nossos atendimentos tendem a aumentar. Precisamos equipe capacitada para dar ao munícipe todo atendimento”. Por fim, José Luiz agradeceu a todos “que fazem o CIATox acontecer de 1982”.

Público aplaude vídeo institucional comemorativo aos 40 anos do CIATox. Foto: Mercedes Santos/ARPI

Casos emblemáticos

Lair Zambon, secretário de Saúde de Campinas, reconhece o benefício do CIATox para o Estado e a Prefeitura. “O Centro nos ajuda muito, principalmente dentro das UBSs, sempre atendendo muito bem. Tem um longo futuro de prestação de serviço e conhecimento”, disse. Além disso, contou sobre sua ligação com o CIATox e o doutor Ronan. “O CCI sempre cruzou a minha formação. Eu felizmente fui aluno, residente e docente, convivendo com doutor Ronan”, disse. Lembrou de dia de plantão em Caieiras, no qual uma garota havia sido intoxicada por organofosforado. “Ninguém sabia o procedimento, mas eu já tinha visto o doutor Ronan tratar esse tipo de intoxicação. Então a paciente saiu bem. Eu virei um ‘mito’ dentro do hospital. São histórias que acontecem e que deixam a gente feliz de ter escolhido a profissão de médico”, disse.

“Antes do CCI nós atendíamos os intoxicados na enfermaria de emergência da Santa Casa, quando precisavam de internação, entre eles os acidentados com animais peçonhentos”, disse Ronan. Entre os casos que marcaram sua carreira, estão o da paciente que havia sido picada por uma cobra d'água, espécie não venenosa, mas que passou muito mal devido à velocidade que foi trazida de Paulínia, quando a rodovia que ligava as cidades não estava em boas condições. Em outra ocasião, chegaram trabalhadores que atuaram na construção da refinaria de Paulínia, que em determinada festa fizeram aposta sobre a ingestão de Aldrin (inseticida e formicida em pó seco, altamente tóxico). Ronan não conseguiu salvar os pacientes. Anos depois, após 2000, o médico atendeu um paciente que havia tentado suicídio, depois ter ingerido Aldrin, convulsionando fortemente. “O pessoal já tinha pegado Diazepam, que era a primeira coisa a se fazer seguindo a conduta da Neurologia. Eu pedi o medicamento Nembutal, pusemos o paciente no respirador e o mantivemos na enfermaria. Nós o controlamos muito bem depois dessa dose. Se fosse seguir a conduta padronizada, ele teria morrido. Com a experiência daqueles de Paulínia, salvei esse”, lembrou Ronan.

Futuro

Fábio Bucaretchi destacou desafios para o CIATox: financiamento das atividades; gestão de recursos humanos; indicadores de qualidade; entre outros. Por fim, o docente fez questão de agradecer aos “alunos, funcionários do CIATox e docentes da Unicamp que continuam colaborando ou foram relevantes colaboradores, desde a criação do CCI, inclusive gestores da FCM, do HC e da Universidade; ao apoio da Secretaria Municipal de Saúde e do Ministério Público do Estado”, bem como às equipes de trabalho da FCM envolvidas nas comemorações dos 40 anos.

Professores Fábio e Ronan descerram placa comemorativa dos 40 anos do CIATox. Foto: Mercedes Santos/ARPI

O professor Ronan se diz pretensioso quanto o futuro do Centro. “O CIATox tem características especiais. É ligado a uma universidade pública, faz o atendimento local, tem laboratório e equipe que está lidando há muitos anos com uma experiência rara no mundo. Sempre foi e permanecerá fundamental nos próximos anos, por uma atividade atualizada, para ter segurança no diagnóstico, evitar gastos e riscos desnecessários”, declarou. Além disso, Ronan destaca a função do CIATox diante da questão ambiental. “Com a Amazônia ameaçada, temos um papel muito mais importante com o estudo e a determinação dos metais pesados. Nós temos de fazer isso logo!”, declarou.

Por fim, Ronan destacou o valor da Unicamp. “Eu vejo que a Universidade consegue dar suporte para organizar projetos que ampliem a capacidade do laboratório, para que possa dar cobertura aos cerca de 30 centros de controle no Brasil, em muitas das dosagens cruciais para diagnóstico de certeza. Nós podemos formar para outros lugares. É isso que Universidade precisa para transmitir conhecimento elementar. Não vejo nenhum outro centro no Brasil nas condições que nós estamos, de modo que eu espero que se use os recursos da Unicamp, do estado e da região. É preciso ‘vender’ a ideia - e boas ideias felizmente ainda são fortes no Brasil”, finalizou o docente.

Ao final do evento, José Luiz Costa entregou homenagens aos professores Eduardo Mello de Capitani, Fábio Bucaretti e Ronan José Vieira. Em seguida, os presentes seguiram ao Espaço das Artes da FCM, onde se encontra exposição contando mais da história do CIATox.

Animais peçonhentos expostos no Espaço das Artes. Foto: Mercedes Santos/ARPI
Abertura da exposição comemorativa. Foto: Mercedes Santos/ARPI 

 



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